“NUUUUU...”
Sou Schmil.
Natural da Bessarábia.
Só falo e entendo “idisch”.
( dialeto do alemão falado pelos judeus oriundos da Europa)
Resolvi viajar para o Japão e
Inglaterra.
Vejam bem, eu um “id”
(judeu) indo viajar pelo mundo. “Main
got!” (Meu Deus)
De início senti muito medo.
Meus amigos me disseram:
-
Schmil, tu tens dinheiro no bolso?
-
Sim...
-
Tens boca?
-
Sim...
-
Então podes aproveitar... Viajar é muito bom. A gente
conhece muita gente... A gente aprende muita “coisa” nova...
E lá fui eu. Acreditei nos meus
amigos. Afinal os amigos dizem sempre a verdade para a gente...
Comprei passagem com o Avrum.
Passagem de avião...
E lá fui eu...
Subi no avião.
“Que coisa linda!” Exclamei.
Nunca tinha entrado num equipamento destes...
Logo de início tive que me
“amarrar” num cinto. Vi que todos estavam fazendo isso... acendeu uma
“luzinha”. Não entendi nada do que estava escrito. Mas... Pensei: “será que as
“amarras” do cinto era para que eu não caísse? Ou para que eu não pudesse ir
para a frente? Eram minhas dúvidas, mas não podia perguntar para ninguém.
Ninguém me entenderia e eu não entenderia eles... Fiquei “amarrado” e quieto.
Vi uma moça muito bonita,
distribuindo balas. Deveria ser a “secretária” do piloto.
Sabem porque?
`Porque ela estava vestida com um
uniforme da cor do uniforme do piloto. Só que ele estava com um “boné” branco e
ela não tinha nada na cabeça, só um lenço “amarrado” no pescoço.
E lá fomos nós...
Começou a subida e eu tive uma
dor no meu “buch” (barriga). “Ui vei...” (expressão idiomática)
A viagem foi tranqüila, até que
num dado momento começou a “sacolejar” e eu fiquei com “medo”. Me lembrei de
algumas “bruches” (bênçãos) e comecei a dizer. Não em voz alta, para não
atrapalhar meus “vizinhos”, mas em voz baixa, não tão baixa assim... Até que
tudo voltou ao normal. Respirei fundo e disse: “Danken got”... (
Obrigado Deus)
-
“Mane tzures” (Meus problemas), pensei com meus
botões. Será que sempre é assim? Com “sacolejos”? Não sei, e nem perguntei.
Ninguém iria me entender... Mas agüentei firme.
Só estava pensando no momento da
parada do avião. O que irei fazer? Não sei nada de japonês. O que fazer?
Lembrei que meus amigos da Bessarábia me disseram que sempre a “gente” encontra
algum conhecido. Assim eu espero. Nós “idn” (judeus) somos muito
amigáveis e conhecidos, até pelos nossos “neizl” (nariz). Espero que me
reconheçam... Espero que falem comigo. Já estou cansado de não poder falar com
ninguém...
Por enquanto estou comendo
bastante.
“Como servem coisas boas neste
“bonde”. Parece um “bonde” de tão grande... Só falta me servirem “ghefilte
fish e hering” ( tipos de peixes). Seria muito legal!! Até agora não me
serviram estas “coisas deliciosas”. Estão servindo outras coisas... Também
boas. Não conheço, mas vou comendo... Vou aguardar, pode ser que venham algumas
coisas “kasher”. Por enquanto nenhuma delas foi “kasher”, mas
está valendo a pena...
O tempo foi passando.
O “ghefilte fish” não
veio.
Ouvi pelo alto falante certas
palavras que não entendi nada, mas observei que meus “companheiros” de viagem
começaram a se mexer e o avião começou a “empinar’ para baixo.
-
Será que estou chegando? Fiquei “nerveishke”
(nervoso).
Pensei: “Na descida vou falar
alto algumas palavras em “idisch”. Pode ser que algum “Shloime”
(Salomão) ou “Yankl” (Jacob), ou mesmo alguma “Surele” (Sarinha)
estejam por ali... vou fazer isso...
E assim aconteceu.
O avião aterrisou com sucesso.
Schmil retirou o cinto de
segurança e desceu entusiasmado com as novidades que estava vendo no aeroporto
de Tókio. Chovia muito...
Por enquanto não viu nenhum
conhecido.
Estava vendo uma “montanha” de
gente. Muita gente!!
Todos japoneses!! disse Schmil
Foi seguindo os outros
passageiros. Foi seguindo numa fila.
Todos foram ao encontro das
malas.
Viu que elas estavam aparecendo
através de um “compartimento redondo”.
Num repente observou a sua mala.
Ficou satisfeito. Pegou e se dirigiu a um portão, assim como os outros estavam
fazendo...
Passou na Alfândega sem falar
nada. Só gesticulando como um mudo.
De repente ele largou um grito:
“NUUUUU...” e viu que várias pessoas olharam para ele e não eram japoneses.
Entenderam!!! Devem ser os Shloimes, Yankl e Sureles...
Eram “idn” que também
estavam viajando e que entendiam o “idisch”. Quando ouviram o
“NUUUUU...” perceberam a palavra
“técnica” dos patrícios “idisch”.
Se abraçaram. Se beijaram. e
foram conversando... Sim, conversando. A
quanto tempo nosso personagem não dialogava...
Schmil ficou alguns dias
no Japão e se dirigiu, agora sem medo, para a Inglaterra..
A partir dali Schmil
chegou a seguinte conclusão: Quando não sabemos falar nenhum idioma basta dizer
“NUUUUU...” em qualquer lugar do mundo que logo aparecerá alguns
entendedores...
“NUUUUU...” , não é verdade?
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