terça-feira, 13 de agosto de 2013

ATÉ BREVE!




ATÉ BREVE!

David Iasnogrodski – escritor, engenheiro, administrador – david.ez@terra.com.br

Até breve!

 
 
 
 
Meu nome? Jovêncio. Para dizer a verdade nem me recordo do outro nome. Há muito vivo aqui. Embaixo desse viaduto. Aqui é minha casa. Desde que perdi minha perna. Foi num acidente. Sei que bebi muito e acordei no hospital e me disseram que estava sem a perna. Foi um desastre para mim. Agora, já passado algum tempo, alguns anos estou aqui nesta “casa”. Aqui tenho minha cadeira de rodas. Meu colchonete. Meu ventilador para o calor. Tem tomada ali embaixo... Tudo isso ganhei com o meu trabalho. Trabalho sim. Aqui na minha “casa”. Venho balas. Balas de goma. Tenho vários “fregueses”. Passam aqui e me compram as balas. É uma vida ingrata. Mas é a minha vida. Tenho celular para falar com alguns “amigos” e colegas. Passeio pouco.
Vou até o outro lado do viaduto. Ninguém nunca me roubou nada. Passam aqui vários ladrões. Eu os conheço. Até os cumprimento. Mas só bom dia e boa tarde. Nada mais. Tenho alguns amigos. Nenhum deles é como eu. Morador de viaduto. Alguns moram embaixo de ponte ou embaixo de marquises. Sei que não incomodo ninguém Sempre fui de boa paz. Tenho um filho. Não sei onde está. Nunca apareceu aqui. Nem me lembro de muito das feições dele. Esta barba comprida que você está me vendo é para disfarçar minha tristeza. Não gosto desta vida, mas é a que eu tenho. Tenho que me conformar. Todos os domingos pela manhã rezo. Assim aprendi com meus pais. Tenho calendário para não me perder dos dias. Rezo para que eu possa viver mais algum tempo. Acredito que não tenho inimigos. Faço minha própria comida. Muitos me doam mantimentos. Não esqueço nunca de agradecer. Sei que é o mínimo que posso fazer, mas assim aprendi com meus pais. Eles não sabem que estou aqui. Fugi de casa. Não me dei bem em nada que fiz. Agora estou aqui. Ora deitado, ora sentado, mas sei os horários de dormir e de levantar para trabalhar. Trabalhar com as minhas balas. À noite é um sofrimento. Já foi pior. Agora estou mais acostumado. Não tanto, mas estou mais “confortado”. Sinto muita tristeza em muitos momentos. Penso muito. Penso em todos. Penso em mim. Mas é assim.
Estou aqui. Neste viaduto. Com minhas balas de goma, meu ventilador, minha cadeira de rodas e meu colchonete. Não me esqueço do celular e do  radinho. Tinha esquecido de dizer que ouço rádio à noite. Música. Gosto muito de música. Tomo banho como posso. Não tenho mais perfume. Acabou! Preciso me manter limpo para meus “fregueses”. Assim é minha vida. A vida de um morador e “zelador” de um viaduto. Digo a todos: Até breve! Porque o até breve? Pois não sei o dia de amanhã. Espero sempre que seja melhor do que hoje. Até breve!

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Que entrevista!

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